Os computadores da liderança do PSDB na
Assembléia Legislativa têm em seus arquivos informações detalhadas
sobre a movimentação e as emendas apresentadas por um "partido"
chamado ABC. A sigla inexiste nos fichários da Justiça Eleitoral
e jamais eleitor algum votou nela. Mas as máquinas da Casa
não são tolas. As letras referem-se a Santo André, São Bernardo
e São Caetano, origem, com outras quatro cidades, da bancada
que mostrou força e organização na votação da Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO) na semana passada.
São sete deputados (do total de 94) de
cinco partidos, tanto da oposição como da base governista,
que deixaram de lado a filiação em suas legendas para jurar
fidelidade aos interesses destas cidades da região metropolitana
de São Paulo. Neste ano, a tática, que nas legislaturas anteriores
já vinha sendo amadurecida, foi oficializada: depois de seis
reuniões eles assinaram conjuntamente 65 emendas à LDO, peça
que define metas e prioridades para o Estado.
Representantes de 2,3 milhões de habitantes
e de cidades que, somadas, têm receita anual de R$ 1,3 bilhão,
eles fizeram pressão sobre o relator da Comissão de Finanças
e Orçamento, Roberto Engler (PSDB), - que os trata em entrevista
como se integrassem um "partido" -, brigaram no plenário e
conseguiram a aprovação de nove propostas, um número considerado
"bom" pelo petista José de Fillipi, ex-prefeito de Diadema,
representante da bancada do ABC na comissão.
"Rompemos a lógica do deputado só pensar
em seu umbigo", garante Fillipi. "A estratégia deu certo;
assinamos juntos todas as emendas e consideramos a região
como um todo." A presença no grupo de deputados dos partidos
aliados ao governo (PTB, PPB e PL) também ajudou, admite.
A bancada é integrada pelo petista Vanderlei
Siraque, ex-vereador de Santo André; os deputados José Augusto,
ex-prefeito de Diadema, e Marco Antônio Tortorello, de São
Caetano, ambos do PPS; o ex-prefeito de Santo André e ex-deputado
federal Newton Brandão (PTB); o ex-vereador de São Bernardo
Ramiro Meves (PL) e Daniel Marins, advogado de São Caetano
do Sul, do PPB. A lista inclui Mauá, Ribeirão Pires e Rio
Grande da Serra.
A articulação desses parlamentares tem
por trás a ação da Câmara Regional do Grande ABC, do Consórcio
Intermunicipal e do Fórum de Vereadores, entidades criadas
a partir de 1991 com o objetivo de superar as fronteiras dos
municípios vizinhos no momento de encontrar soluções para
os problemas. Nelas, discute-se questões como transportes,
lixo, desemprego e enchentes.
"Não adianta resolvermos o problema das
enchentes de Diadema e não resolvermos o de São Bernardo",
observa José Augusto. "É o mesmo rio que corta as cidades."
O parlamentar do PPS comemora a atuação da bancada e diz que
esta é conseqüência da organização da sociedade das sete cidades,
que concentram sindicatos de peso. "Conseguimos, neste ano,
fazer esta experiência", conta.
"Agora, nossa atuação ficou mais organizada",
concorda Newton Brandão, do PTB. Para este parlamentar, o
que ocorre na Assembléia é reflexo da cobrança dos 936 mil
eleitores. "O eleitor da região do ABC é evoluído", avalia
Brandão. "Nossa ação precisou melhorar porque o povo é exigente."
Os projetos apresentados pela bancada do
ABC à LDO foram formulados em consultas a essas entidades.
A Câmara Regional do ABC tem, por exemplo, um Conselho Consultivo
do qual faz parte o governador Mário Covas e os prefeitos
da região. "Este Conselho abriga os deputados e já aponta,
de certa forma, qual será nossa ação no Legislativo", explica
Fillipi.
O grupo não cuida apenas dos interesses
da região no Orçamento. Em abril, a bancada do ABC aprovou
moção no plenário a favor das propostas do Consórcio Intermunicipal
para a reforma tributária em tramitação na Câmara.
Segredo - Para o segundo semestre,
já há planos: ocupar os espaços possíveis na TV Legislativa,
o canal a cabo da Assembléia que vai voltar ao ar, e no Fórum
Parlamentar São Paulo Século 21, que ocorrerá na Casa - além,
naturalmente, de pressionar o relator e o governo na elaboração
do Orçamento do ano 2000, peça que define o destino dos recursos
públicos.
O parlamentar revela, por fim, o segredo
da coesão da bancada suprapartidária: não se deve falar da
vida ou da ação política dos líderes de cada um - Luiz Inácio
Lula da Silva (PT), Ciro Gomes (PPS) e Paulo Maluf (PPB) -
e, nos assuntos que não dizem respeito à região, cada um vota
de acordo com sua consciência ou partido. Nada deve ser dito
também sobre a campanha eleitoral do ano que vem, uma vez
que a maioria pretende disputar prefeituras e, em alguns casos,
serão adversários. "É assunto proibido", avisa Fillipi.
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